sábado, 11 de abril de 2009

Ainda a culinária



Depois que “cheguei chegando” nos restaurantes e festas de Boa Vista, experimentando tudo quanto era tempero e ingrediente novo, eu estava resolvido a dar uma acalmada, atendendo a pedidos do meu sistema digestivo. O estômago do roraimense é, antes de tudo, um forte. Uma receita típica, para exemplificar: peixe à delícia. Postas de peixe empanado, com molho de creme de leite e azeitona, coberto com queijo e batata palha, acompanhado de banana frita, arroz e farofa e calor de quarenta graus.
Duas outras frustrações, idéias que eu fazia de Boa Vista que se mostraram falsas (entre muitas outras): eu achava que o açaí e a castanha-do-pará seriam de ótima qualidade, fartos e baratos. Infelizmente, não. Existem em grande quantidade e são relativamente fáceis de achar, mas... Conversei hoje com um professor paraense, Luiz Otávio, que também acha que o açaí de Boa Vista não é bom. Segundo ele, o caroço é batido além do ponto, o que produz o que ele chamou de “travo”, uma espécie de fundozinho amargo no sabor. Além disso, fazem o açaí com uma textura muito fina, quase um caldo, diferente do açaí paraense, que fica cremoso, quase um sorvete. A castanha-do-pará é sim abundante, mas não é barata, nem em qualidade superior à encontrada em Campo Grande ou Brasília. Ao contrário, encontra-se para vender a castanha de padrão inferior, tamanho menor do que o “tipo exportação” que vai parar nos mercados das cidades maiores.
Em compensação, para não dizerem que eu estou implicando com tudo, e para inaugurar uma nova etapa no blog: posto a foto do peixe grelhado que se come no Peixe Mania, considerado a melhor peixaria de Boa Vista. Realmente muito gostoso, magrinho, bem passado, com batata sauté, arroz branco, farofa e feijão catador. Se não me engano, é uma dourada (não confundir com o dourado, que a gente encontra na Bacia do Paraná e do Paraguai). No fundo da foto, estão a Profª. Adriane Augusta, da Arquitetura, e a Julia. Ah, a máquina é a digital do meu telefone celular.

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Mais tarde, fui à praia do Rio Branco com o Thiago e a Pilar. Eles ainda não tinham almoçado. Tomamos uma cerveja, conversamos um pouco de bobeira, me contaram sobre outro dia em que tinham visto o boto, e dali a pouco começamos a sentir um cheiro bom de peixe frito. Vinha da barraca da Dona Sebastiana, uma indígena de uns cinqüenta e tantos anos, que estava com toda a família. “A senhora serve um peixinho frito?”. Ela disse que servia por vinte reais. “Vinte reais?” Ela deixou por quinze, acompanhando baião-de-dois, farofa, vinagrete e pimenta. “Essa matrinchã aqui” – e me mostrou o peixe de pouco mais de um palmo de comprimento, dentro do isopor com gelo e que, depois eu descobri, fritinho tem um gosto bem familiar, parecido com o de lambari. Topamos. Era o fim do armistício com o meu sistema digestivo.
Já estava no comecinho da noite. A praia estava pequena porque o rio estava alto. O que acontece quando a praia está pequena? Apareceram os maiores predadores de Roraima. Carapanãs! Fomos carapanizados à queima-roupa. O homem, topo da cadeia alimentar? Nada. O peixe come a alga, o homem come o peixe, o carapanã come o homem.